terça-feira, 9 de outubro de 2007

A Longa e Escura Noite do Behaviorismo

Update: Este post, baseado em uma tradução (fonte citada ao final), passa uma imagem equivocada daquela é, sem sombra de dúvida, a mais importante contribuição teórica à Psicologia e à intervenção em saúde mental já feita. Algumas (re)considerações podem ser encontradas aqui: http://psicologiarg.blogspot.com.br/2008/04/retomando-b-f-skinner.html
Escrevi este post durante minha formação (no primeiro ano do curso de Psicologia), e não me envergonho dele, especialmente por ter sido por meio de posts equivocados como este que me deparei com pessoas que me auxiliaram a retificar minhas concepções.

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O que aconteceu com os filhos do psicólogo J. B. Watson, sua neta Mariette Hartley, e com Deborah, a segunda filha do psicólogo B. F. Skinner?

Acredito que tenha sido Eric Berne, o fundador da psicoterapia de Análise Transacional1, que cunhou a expressão “a longa e escura noite do behaviorismo.” A abordagem behaviorista da psicologia experimental foi inaugurada por J. B. Watson em um manifesto intitulado “Psicologia da maneira como é vista pelos Behavioristas”, publicado em 1913 no Psychological Review. Ele era o editor deste jornal no momento da publicação, e chefe do departamento de psicologia da Universidade Johns Hopkins. O Behaviorismo tornou-se o paradigma mestre da psicologia por, no mínimo, cinqüenta anos, até o início da década de 1970, e provavelmente seu expoente mais bem conhecido seja B. F. Skinner. Para resumir o ponto de vista behaviorista, irei citar uma passagem do livro “Admirável Mundo Novo Revisado”2, de Aldous Huxley, publicado em 1958. Huxley usou a forma britânica de soletrar ‘behaviour’:
Por razões práticas ou teóricas, ditadores, homens de organizações e certos cientistas estão ansiosos por reduzir a enlouquecedora diversidade da natureza do homem para algum tipo de uniformidade gerenciável. No primeiro lampejo de seu fervor behaviourístico, J. B. Watson declarou repetidas vezes que ele não conseguia encontrar “nenhuma confirmação para padrões hereditários de comportamento, nem para habilidades especiais (música, arte, etc.) que são supostamente transmitidos pelas famílias.” E mesmo atualmente nós encontramos um distinto psicólogo, o Professor B. F. Skinner de Harvard, insistindo que “a medida que a exploração científica se torna mais e mais abrangente, a contribuição que pode ser atribuída ao indivíduo em si aproxima-se de zero. Os poderes criativos do homem, tão ostentados, suas realizações artísticas, científicas e morais, sua capacidade para escolher e nosso direito de o responsabilizarmos pelas conseqüências de sua escolha – nada disso é coerente com o novo auto-retrato científico.”
Huxley cometeu um pequeno engano em sua citação de Skinner que, na verdade, escreveu “suas realizações artísticas originais, científicas e morais...” Essa passagem pode ser encontrada no “Registro Cumulativo”3 de B. F. Skinner (edição reimpressa: Copley Publishing Group, 1999). Em outras palavras, os behavioristas consideravam que o comportamento humano era principalmente modelado pelo condicionamento ambiental, e que fatores hereditários eram de muito pouca importância. Esta foi a regra geral da a psicologia acadêmica por cinqüenta anos até que o vento mudou de direção.4 Agora a psicologia ‘evolucionária’ e a busca por ‘predisposições genéticas’ ganharam espaço. Parece muito difícil para a maioria dos psiquiatras e psicólogos das universidades entenderem que ambos os fatores estão fundamentalmente interligados.
Para a maioria dos estudantes de psicologia, o nome B. F. Skinner está associado à experimentos de condicionamento de ratos e pombas em ‘caixas de Skinner’, e o nome J. B. Watson com a indução de fobias em um bebê conhecido como ‘Pequeno Albert’ (ver o experimento do Pequeno Albert na Wikipédia)5. Desconhecemos que fim levou o Pequeno Albert.6

Os filhos de J. B. Watson

Watson submeteu seus filhos a um duro regime de criação, agendando as refeições e sem afetos físicos. Seu primeiro casamento com Mary Ickes lhe deu uma filha chamada Mary (também conhecida como Polly), e um filho chamado John. Polly tentou suicidar-se diversas vezes, e o ‘Pequeno John’ se tornou uma pessoa sem raízes, apagado por seu pai. O Pequeno John sofreu com problemas estomacais e fortes dores de cabeça durante toda sua vida, vindo a morrer com pouco mais de 50 anos de uma hemorragia causada por úlceras.
Depois de um escandaloso caso com a estudante Rosalie Rayner, que era jovem o suficiente para ser sua filha, sua esposa Mary pediu o divórcio e ele foi demitido da Universidade John Hopkins. Em seguida, ele casou-se com Rosalie e tiveram dois filhos, Billy e Jimmy. Na idade adulta, Billy rebelou-se contra o behaviorismo de seu pai e estabeleceu uma carreira bem sucedida com um psiquiatra psicanalista. Mas nem por isso deixou de tentar o suicídio. Em sua primeira tentativa foi impedido por seu irmão mais novo, Jimmy; vindo a morrer em sua segunda tentativa. Jimmy, por sua vez, sofreu de problemas estomacais crônicos durante anos (talvez um legado das refeições agendadas durante a infância?), mas conseguiu superar seus problemas após uma intensa terapia. Um artigo7 sobre J. B. Watson no site da Clayton State University refere-se ao suicídio de Billy:
Infelizmente, embora B. F. Skinner tenha se gabado que o “bebê em uma caixa” [de Watson] cresceu saudável e feliz, a experimentação de Watson com crianças carece de validade testemunhal: William, seu primogênito com Rosalie, cometeu suicídio aos 40 anos, apenas quatro anos após a morte de John Watson.

Em 1930, enquanto seus filhos ainda eram jovens, Rosalie Rayner Watson escreveu um artigo para a Parents Magazine intitulado “Eu sou a Mãe dos Filhos de um Behaviorista”8, no qual ela expressa o desejo de que seus filhos cresçam para apreciar a poesia e o drama da vida. Ela diz: “em alguns aspectos eu me curvo à grande sabedoria da ciência do behaviorismo, e em outros eu me rebelo. [...] gosto de estar feliz e contente, e de dar risadas. Os behavioristas pensam que risadas são um sinal de desajustamento.” Cinco anos depois ela morreu de pneumonia. Existe um artigo sobre John B. Watson e Rosalie Rayner na Johns Hopkins Magazine, publicado pela universidade onde ele foi professor de psicologia: Está tudo no Educação.9 John Broadus Watson tornou-se um recluso perto do final de sua vida. Ele queimou todos seus registros antes de morrer em 1958.

Mariette Hartley: Quebrando o Silêncio

Este não é o fim da saga familiar de Watson. Sua neta é Mary Loretta Hartley (também conhecida como Marietta ou Mariette)10, melhor conhecida por seus comerciais de TV para a Polaroid nos quais ela faz o papel de esposa de James Garner. Contudo, as circunstâncias de sua infância foram aterrorizantes. Sua mãe, silenciosa e repleta de ódio, era alcoólatra e repetidas vezes tentou o suicídio. Seu pai, um executivo do ramo do marketing, suicidou-se aos 67 anos depois de uma longa depressão. Mariette estava tomando café da manhã com sua mãe quando elas ouviram o tiro. Estas circunstâncias levaram Mariette a também tornar-se uma alcoólatra e a ter pensamentos suicidas, até o ponto em que sua carreira foi arruinada. Ela conseguiu superar seus problemas e reorganizar sua vida com a ajuda de um amigo e mentor.
Mais tarde em sua vida, ela escreveu as memórias de suas experiências no livro “Quebrando o Silêncio”11 (Putnam Group, 1990). Isto é o que ela tem a dizer sobre os princípios de criação de seu avô: “As teorias de meu avô infectaram a vida de minha mãe, a minha vida, e a vida de milhões. Como você pode encerrar um legado? Como você pode impedir a passagem de uma herança debilitante, de geração em geração, como se fosse uma falha genética?”
J. B. Watson foi o autor do sucesso de vendas “O Cuidado Psicológico do Bebê e da Criança”12, um manual para a educação de crianças. Depois de sua recuperação, Marietta Hartley tornou-se a diretora honorária da Fundação Americana de Prevenção ao Suicídio13, participando ativamente da campanha. Ela recebeu premiações humanitárias de inúmeras organizações incluindo, no seu estado natal, do Centro de Estudos da Família da Califórnia, da Associação Psicológica de Los Angeles e do Centro de Imagens Cerebrais da Universidade da Califórnia, em Irvine.
Mariette também escreveu e atuou na peça solo baseada em sua autobiografia. Em “Se você chegar em Belém, você foi longe demais”14, que irá estrear em janeiro de 2006, ela retrata os principais personagens que moldaram sua vida. Para mais informações sobre a família de J. B. Watson, seus casamentos e seus filhos, é interessante recorrer às notas de palestras no site da Sonoma State University, da Califórnia.15 Tais notas começam com trechos extraídos do livro de Mariette.

As filhas de B. F. Skinner

Talvez seja por causa das conseqüências atrozes do método de J. B. Watson de educação com seus próprios filhos que surgiu uma lenda urbana sobre o destino da segunda filha de B. F. Skinner, Deborah. Sua primeira filha, Julie (ver: http://www.julievargas.com), tornou-se uma psicóloga educacional. O mito de que Deborah cometeu suicídio surgiu com uma invenção de Skinner para substituir o berço tradicional, ou ‘babytender’. Skinner chamou sua invenção de Berço de Ar, mas também referia-se a ela como o ‘condicionador de herdeiros’16. Tratava-se de algo semelhante a uma grande incubadora como àquelas utilizadas nos hospitais, com um painel lateral de plexiglass que podia ser selado, permitindo que o interior fosse aquecido. Sua função era prover um local quente, silencioso e confortável para Deborah dormir nos invernos severos de Minnesota, sem ter que ser enrolada em diversas camadas de roupas e cobertores. Infelizmente, o artigo que Skinner escreveu sobre seu ‘babytender’ para o Ladies’ Home Journal em 1945, recebeu o título de “Bebê na Caixa” (Baby in a Box). Muitas pessoas chegaram à conclusão precipitada de que esta era uma variação da caixa de Skinner – utilizada em experimentos com animais – para bebês. A verdade é mais benígna. Deborah é uma artista e pintora bem sucedida. Você pode ler a opinião dela sobre o ocorrido em uma reportagem publicada em 2004 no jornal The Guardian.17 É sua resposta ao livro de Lauren Slater, “Abrindo a Caixa de Skinner: Grandes Experimentos Psicológicos do Século Vinte.”
É possível ver uma foto grande da versão comercial do Berço de Ar de Burrhus Frederic Skinner na Coleção de Aparatos18 nos Arquivos da História da Psicologia Americana da Universidade de Akron. A maioria dos Berços de Ar foram comprados por psicólogos.
Postado por Brad.
1Transactional Analysis psychotherapy.
2Brave New World Revisited – revisitado, no sentido de revisado. N.T.
3Cumulative Report
4No original: “[...] the pendulum swung in the other direction.” N.T.
5Endereço: http://en.wikipedia.org/wiki/the_Little_Albert_experiment
6Ver a passagem referente em DAVIDOFF, Linda. Introdução à Psicologia. 3ª edição. São Paulo : Makron, 2001. p. 106. N.T.
7Ver: http://a-s.clayton.edu/mccarty/PSYC3540/Web%20links/watson.html
8I Am the Mother of a Behaviorist’s Sons
9It’s all in the Upbringing – Ver: http://www.jhu.edu/%7Ejhumag/0400web/35.html
10Ver: http://www.mariettehartley.com
11Breaking the Silence
12The Psychological Care of Infant and Child
13American Foundation for Suicide Prevention
14If You Get to Bethlehem, You’ve Gone Too Far
15Ver: http://www.sonoma.edu/users/d/daniels/Watson.html
16Air Crib / ‘heir conditioner’.
17Ver: http://books.guardian.co.uk/departments/healthmindandbody/story/0,6000,1168052,00.html
18Ver: http://www3.uakron.edu/ahap/apparatus/apparatus.phtml?code_id=6&app_id=306

Fonte
RoboThink blog. Disponível em: http://robothink.blogspot.com/2005/09/long-dark-night-ofbehaviorism.html Acesso em: 08 de outubro de 2007.

4 comentários:

skox disse...

A qui está o que houve com o Pequeno Albert [agora conhecido realmente como Douglas Merritte]. Ele morreu com 6 anos:

http://www.apa.org/monitor/2010/01/little-albert.aspx

http://scienceblogs.com.br/100nexos/2009/11/o_triste_fim_do_pequeno_albert/

Enfim, isso é tudo ...

Tchau e ótimo blog !!!!

skox disse...

Este Pequeno Albert é um pseudônimo de Douglas Merritte [faleceu aos 6 anos de idade]. Veja:

http://scienceblogs.com.br/100nexos/2009/11/o_triste_fim_do_pequeno_albert/

Anônimo disse...

Obrigado por diminuir a credibilidade da psicologia! É disso que precisamos sem dúvidas!

Psicólogo Cláudio Drews disse...

Palavra afiada: obrigado pelo comentário, acho que este antigo post necessita de esclarecimentos.