Tradução e comentários à algumas cartas enviadas por cientistas e filósofos em resposta à pergunta: No que você acredita e não pode provar?, do site Edge (www.edge.org). Meus comentários estão entre chaves '[ ]' e em itálico, para não se confundirem com as idéias defendidas pelos autores.
DANIEL GILBERT
Psicólogo, Harvard University
Fonte: http://www.edge.org/q2005/q05_10.html#gilbert
Em um futuro não muito distante nós seremos capazes de construir sistemas artificiais que irão exibir toda a aparência de sistemas conscientes, que irão agir como nós agimos em todos aspectos. Estes sistemas irão falar, andar, piscar, mentir e aparentar perturbação pela proximidade das eleições. Eles irão afirmar que são conscientes e irão exigir seus direitos civis. Mas nós não termos um meio para saber se o comportamento deles não passa de um truque não mais genial do que um pombo que foi treinado para digitar "Eu sou, eu sou!"
Nós tomamos a consciência de cada um de nós na base da fé, pois nós precisamos, mas após 200 anos de discussão sobre este assunto, ninguém jamais conseguiu elaborar um teste definitivo para a sua existência. A maioria dos cientistas cognitivos acreditam que a consciência é um fenômeno que emerge da interação complexa de partes absolutamente inconscientes (neurônios), mas mesmo quando nós finalmente entendermos a natureza desta interação complexa, nós ainda seremos incapazes de provar que ela produz o fenômeno em questão. Ainda assim, eu não tenho a menor dúvida de que todos aqueles que eu conheço possuem uma vida interior, uma experiência subjetiva, um senso de self, que é muito semelhante ao meu.
No que eu acredito ser verdade que eu não posso provar? A resposta é: Você!
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O modelo de investigação científica atual, que exige um observador externo, realmente torna difícil a abordagem da consciência, da experiência subjetiva e do self. Enquanto a evolução de técnicas de neuroimagem e dos testes neuropsicológicos torna cada vez mais possível a observação de processos cognitivos importantes -- já é possível distinguir com uma margem de erro aceitável se uma pessoa está olhando para uma casa ou para um rosto observando as imagens de sua atividade cerebral -- ainda falta muito para que possamos observar a significação que é dada a tais imagens. Talvez já seja possível ou quase possível observar que alguém se sente bem observando a foto de um familiar próximo ou da pessoa amada, mas identificar tudo (memórias, associações, etc) que leva essa pessoa a se sentir bem ao visualizar tal imagem e se sentir mal quando vê a imagem de alguém que lhe causou muito sofrimento, é outra história. Quem sabe um dia no futuro? Já existem discussões acerca da privacidade de pensamento em face aos avanços da neurociência. (:
Psicólogo, Harvard University
Fonte: http://www.edge.org/q2005/q05_10.html#gilbert
Em um futuro não muito distante nós seremos capazes de construir sistemas artificiais que irão exibir toda a aparência de sistemas conscientes, que irão agir como nós agimos em todos aspectos. Estes sistemas irão falar, andar, piscar, mentir e aparentar perturbação pela proximidade das eleições. Eles irão afirmar que são conscientes e irão exigir seus direitos civis. Mas nós não termos um meio para saber se o comportamento deles não passa de um truque não mais genial do que um pombo que foi treinado para digitar "Eu sou, eu sou!"
Nós tomamos a consciência de cada um de nós na base da fé, pois nós precisamos, mas após 200 anos de discussão sobre este assunto, ninguém jamais conseguiu elaborar um teste definitivo para a sua existência. A maioria dos cientistas cognitivos acreditam que a consciência é um fenômeno que emerge da interação complexa de partes absolutamente inconscientes (neurônios), mas mesmo quando nós finalmente entendermos a natureza desta interação complexa, nós ainda seremos incapazes de provar que ela produz o fenômeno em questão. Ainda assim, eu não tenho a menor dúvida de que todos aqueles que eu conheço possuem uma vida interior, uma experiência subjetiva, um senso de self, que é muito semelhante ao meu.
No que eu acredito ser verdade que eu não posso provar? A resposta é: Você!
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O modelo de investigação científica atual, que exige um observador externo, realmente torna difícil a abordagem da consciência, da experiência subjetiva e do self. Enquanto a evolução de técnicas de neuroimagem e dos testes neuropsicológicos torna cada vez mais possível a observação de processos cognitivos importantes -- já é possível distinguir com uma margem de erro aceitável se uma pessoa está olhando para uma casa ou para um rosto observando as imagens de sua atividade cerebral -- ainda falta muito para que possamos observar a significação que é dada a tais imagens. Talvez já seja possível ou quase possível observar que alguém se sente bem observando a foto de um familiar próximo ou da pessoa amada, mas identificar tudo (memórias, associações, etc) que leva essa pessoa a se sentir bem ao visualizar tal imagem e se sentir mal quando vê a imagem de alguém que lhe causou muito sofrimento, é outra história. Quem sabe um dia no futuro? Já existem discussões acerca da privacidade de pensamento em face aos avanços da neurociência. (:
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DANIEL C. DENNETT
Filósofo,Tufts University, autor de Freedom Evolves
Fonte: http://www.edge.org/q2005/q05_10.html#dennett
Eu acredito, mas não posso ainda provar, que a aquisição de uma linguagem humana (uma linguagem oral ou de sinais) é uma condição necessária para a consciência - no sentido forte de que haja um sujeito, um Eu, um 'algo que é como algo para ser'. Segue, então, que animais de outras espécies e crianças que ainda não adquiriam uma linguagem, embora possam ser sensíveis, alertas, respondentes à dor e ao sofrimento, e competentes cognitivamente de muitas formas notáveis - incluindo maneiras que ultrapassam a competência de um humano adulto normal - não são realmente conscientes (no sentido forte): não há um sujeito organizado (ainda) para ser apreciador ou sofredor, nenhum proprietário das experiências em contraste com um mero locus cerebral de efeitos.
Esta afirmação pode ser chocante para muitas pessoas, que temem que ela irá remover os animais de outras espécies e as crianças que ainda não adquiriram uma linguagem da proteção moral, mas não é este o caso. De quem é a dor quando a dor ocorre no recém nascido? Não há ainda um indivíduo a quem a dor pertença, mas este fato não nos dá o direito de infligir estímulos dolorosos em bebês ou em animais, da mesma forma que não temos o direito de abusar do corpo ainda vivo de pessoas em coma que estão absolutamente inconscientes.
Se a noção de self se desenvolve gradualmente, então certos tipos de eventos se tornam experiências apenas gradualmente, e não haverá uma fronteira bem definida entre dores inconscientes (se assim podemos chamá-las) e dores conscientes, e ambas merecem atenção da moral. (E, é claro, a verdade da hipótese empírica é, de qualquer forma, estritamente independente de suas implicações éticas, quaisquer que sejam elas. Aqueles que rejeitam uma hipótese meramente com base na moral estão deixando que o pensamento mágico [forma primitiva de racionalização, em inglês wishful thinking] suplantar uma atitude científica apropriadamente inquisitiva. Fico feliz em dar aos animais e às crianças pequenas o "benefício da dúvida" para propósitos morais, mas não para propósitos científicos. Aqueles que ficam chocados com a minha hipótese devem parar, se forem capazes de suportar, e perceber o quanto é difícil provar que ela está errada, ao invés de certa. Mas pode ser, penso eu, que eventualmente assim seja comprovado. Aqui está o que será preciso, de uma forma ou de outra:
(1) Um modelo bem confirmado da arquitetura funcional da consciência de um adulto humano, demonstrando como que os longos caminhos de interações reentrantes ou reverberantes precisam ser dispostos e mantidos pelas diferentes formas de cascatas de auto-estimulação que advém com o uso da linguagem;
(2) Uma interpretação da dinâmica do modelo que explique o motivo, fora aqueles bem explorados caminhos de micro-hábitos neurais, que não há unidade funcional ao sistema nervoso - nenhuma unidade para distinguir um Eu de um nós (ou de uma multidão) como candidato a sujeito(s) servido por o sistema nervoso em questão [para entender melhor este item, é preciso conhecer a abordagem do Dennett ao experimento mental do cérebro na jarra];
(3) Um hospedeiro de posteriores trabalhos experimentais demonstrando a importância daquilo que Thomas Metzinger chama de modelo fenomenológico da relação de intencionalidade (PMIR) na habilitação de todas as formas de experiências que consideramos centrais para nossa própria consciência adulta. Este trabalho irá demonstrar que a esperteza animal nunca requer as habilidades que são identificadas nos seres humanos, e que os animais são, de fato, incapazes de apreciar muitas coisas que nós normalmente tomamos por certas na nossa experiência consciente.
Esta é uma hipótese empírica, e pode muito bem ser provada falsa. Pode ser provada falsa caso fique demonstrado que de fato os caminhos necessários que unem funcionalmente sistemas cerebrais importantes (nas formas que eu clamo serem necessárias para a consciência) já estarem presentes em um bebê normal [anatomicamente o cérebro do bebê não possui todos os giros, sulcos, estruturas e tratos que o cérebro de um adulto? eu acho que sim -- a mielinização de certos 'caminhos' se dá posteriormente durante o desenvolvimento, podendo levar até os 25 anos de idade para se completar, mas é bastante seguro afirmar que um indivíduo com menos de 25 anos é uma entidade consciente.. ou não?] ou durante o desenvolvimento fetal, e de fato estejam presentes, digamos no sistema nervoso de todos os mamíferos com certa maturidade.
Cof.. Cof.. - Imagem obtida no site de Mark Dow, LCNI.
Cof.. Cof.. - MRI de um bebê prematuro.
O que eu vejo? Sulcos, giros... Nem um
pouco estranhos. Imagem obtida
em Washington University MedNews.
Eu duvido que isso seja verdade pois me parece claro que a evolução já demonstrou que uma grande variedade de coordenação adaptativa pode ser alcançada sem tais meta-sistemas hiper-unificantes, como é o caso de colônias de insetos sociais, por exemplo. Como é ser uma formiga em uma colônia? Nada, eu afirmo, e penso que a maioria iria concordar intuitivamente. Como é ser parte de um rebanho de gado? Nada (mesmo que seja como ser um boi individual) [eu me pergunto com base no quê ele afirma tais coisas]. Mas então nós temos que considerar seriamente a extensão na qual animais - não apenas colônias de insetos e répteis, mas ratos, baleias e, sim, morcegos e chimpanzés - podem se virar com cérebros de certa forma desunificados.
A evolução não iria prover habilidades além daquelas que não são necessárias para que os membros destas espécies sejam capazes de realizar as tarefas que se apresentam para as suas vidas. [Oh.. então porquê raios nós fazemos música? A evolução cria coisas 'inúteis' para a sobrevivência, ou que apenas dêem alguma vantagem mas não sejam condicionais à sobrevivência... Se um pavão não tivesse penas coloridas no rabo as fêmeas seria atraídas por outro atributo qualquer. Ninguém precisa de uma Ferrari para se locomover numa cidade, mas certamente que uma Ferrari vai ajudar na transmissão da carga genética de um indivíduo.] Se animais fossem como criaturas imaginárias nas ficções de Beatrix Potter ou Walt Disney, eles teriam consciência da mesma forma que nós temos. [Isso porque você acredita que é preciso falar para ser consciênte desta forma.. Duh..] Mas animais são mais diferentes de nós do que geralmente imaginamos, iludidos como somos por estas ficções antropomórficas charmosas. [Eu discordo da hipótese dele e cresci sem assistir aos filmes da Disney pois não me atraíam nem um pouco.] Nós precisamos destas habilidades para nos tornar pessoas, indivíduos comunicativos capazes de perguntar e responder, pedir e proibir, e prometer (e mentir). Mas nós não precisamos nascer com estas habilidades, uma vez que a audição normal irá causar as disposições neurais necessárias. [Hãã? Não foi assim que eu li nos livros de neurociência. O.o -- a estimulação externa leva ao desenvolvimento de sistemas já presentes.] A subjetividade humana, estou propondo, é um notável produto colateral da linguagem humana, e nenhuma versão desta poderia ser extrapolada a qualquer outra espécie a princípio, mais do que pudéssemos assumir que os sistemas rudimentares de comunicação de outras espécies são verbos, pronomes, adjetivos e etc.
Por fim, uma vez que em geral há um mal entendido quanto a isto, eu não estou dizendo que toda a consciência humana consiste em falar consigo mesmo em silêncio, embora boa parte dela consista. Eu estou dizendo que a habilidade de falar consigo mesmo silenciosamente, a medida que se desenvolve, também trás consigo a habilidade de rever, admirar, apreciar, reconsiderar, e em geral alcançar o conteúdo dos eventos no sistema nervoso do indivíduo, que de outra forma teriam seus efeitos de uma forma meramente "balística", deixando nenhuma memória ao serem despertados, e contribuindo para o direcionamento do indivíduo de formas que são bem descritas como inconscientes. Se um sistema nervoso pode possuir todas estas habilidades sem possuir uma linguagem [humana] então estarei errado.
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A minha pergunta ignorante e simplória como pode soar, em resposta à esta hipótese do Dennett é: por acaso ele já ouviu a mente de uma criança que ainda não desenvolveu a linguagem (da forma que conhecemos) ou a mente de um animal não humano? Ou viu, se for o caso?
Pensamento verbal é uma das muitas formas de pensar, Nikola Tesla que o diga -- talvez Nikola Tesla seja uma daquelas pessoas que jamais perdeu a habilidade de pensar como uma criança pensa antes de sofrer o domínio do hemisfério esquerdo.
Quando reflito sobre minhas experiências, às vezes reflito na forma de palavras e sentenças (geralmente uma mistura mais ou menos homogênia de português e inglês); mas, enquanto as palavras não estão sempre presentes, e mesmo quando estão, meu pensamento sempre vem acompanhado de imagens -- imagens completamente abstratas que eu não seria capaz de descrever por meio de palavras, além de imagens do dia a dia.
Não me sinto apto a afirmar que esta forma de pensar seja exclusivamente minha, nem mesmo que me dê alguma vantagem. Por exemplo, não foi fácil desenvolver uma forma de me lembrar de uma quantidade grande de conceitos que precisam ser descritos na forma de sentenças objetivas, mas também não foi impossível.
Por outro lado, meu "mundo interno" é extremamente rico, colorido e interessante, muitas vezes infinitamente superior ao mundo que meus sentidos trazem, especialmente naquilo que se refere ao que codifico na forma de linguagem.
Afinal, ver uma bela flor em um passeio pelo campo numa tarde agradável de primavera não é a mesma coisa que dizer: "Eu vi uma bela flor em um passeio pelo campo numa tarde de primavera." E por mais que eu me alongasse na descrição, ainda assim não seria a mesma coisa, para aquele que escuta, que vivenciar aquela experiência.
Da mesma forma, se minha reflexão fosse muito centrada na forma lingüística de análise ou introspecção, muito seria perdido. Concordo que a linguagem, quando bem desenvolvida e rica, dá a estrutura necessária para um pensamento mais coerente. Mas não concordo que seja uma condição necessária para uma apropriação da experiência.
Até que ponto uma criança que não domina a linguagem ou um animal não humano são capazes de se apropriar das experiências? Não sei, uma coisa eu sei ao certo, a dor inflingida a eles lhes pertencem sim, e lhes causa sofrimento enquanto entidades individuais e únicas.
Uma questão que eu gostaria de fazer ao ilustre filósofo, e talvez lhe envie por e-mail na esperança de receber uma resposta, é: Onde ficam os primatas não-humanos que dominam uma linguagem de sinais rudimentar que inclui palavras como "eu", "gostar", "sentir" e "dor"? Ora... Posso criar um programa que faça uso de tais palavras. Mas um computador, ou mesmo um robô, não teriam uma amígdala, nem um hipotálamo, nem um córtex, para se apropriar do sentido destas palavras. Por outro lado, tanto um animal não humano quanto as crianças que não adquiriram uma linguagem possuem tal instrumental biológico. Macacos, cachorros, pássaros e principalmente crianças, sentem dor e sabem quando estão sentido dor.
As vezes paro um pouco de ficar andando em círculos nos conceitos filosóficos de qualia e consciência e penso: que coisa mais idiota questionar a experiência subjetiva da dor, do prazer, do que quer que seja. Eu tenho a minha experiência subjetiva. A riqueza que a presença dos meus amigos me trás é indício forte o suficiente para que eu acredite que eles também detém essa habilidade.
Por fim, muitas coisas na ciência são tomadas por verdades pela mera observação das reações. A ciência acredita que a radiação acima do limite tolerado pelo organismo irá causar danos aos tecidos e eventualmente a morte. Ninguém fica se questionando se não é o organismo que se autodestrói na presença da radiação, sem influência direta desta, só para nos iludir. Isso, talvez, porque hoje em dia conhecemos em grande medida os mecanismos pelos quais a radiação age no organismo. Mas não vejo motivo para questionar se um ser não verbal sente dor, quando este exibe todo um comportamento que afirma que sim, ele sente dor, ele aprende a ter medo daquilo que causa dor, e assim por diante. Está certo que a observação dos eventos nem sempre é suficiente para a elaboração de um modelo correto -- todos conhecem (ou deveriam conhecer) o questionamento de Wittgenstein quanto ao motivo pelo qual se acreditou durante tanto tempo que as estrelas e o Sol giravam em volta do planeta Terra. Contudo não vejo motivo para levar isso ao extremo e dizer que, embora todos os seres mais complexos demonstrem um comportamento que claramente indica que eles sentem dor, eles não sejam capazes de sentí-la e ter noção de que aquela dor lhes pertence. Sou capaz de dizer que não vejo motivo para acreditar que animais superiores sejam incapazes de sofrimento psicológico. Ora, cadelas somatizam a gravidez psicológica, pássaros somatizam doenças que lhes causa a perda das penas quando submetidos a grande estresse... Então sim, existe uma entidade subjetiva, passível de sofrimento - e também de prazer e apreciação - ainda que não verbal da forma como o ser humano concebe a linguagem.
Não digo isso tudo pela necessidade de acreditar em algo moral, bonitinho e politicamente correto. Estou ciente de que a ciência não existe para nos tornar mais felizes e que as leis naturais não precisam necessariamente obedecer nossa moral humana. Digo essas coisas simplesmente baseado na observação. Vejo um gato se espreguiçando ao sol e não consigo deixar de pensar: se existe um animal que realmente é capaz de sentir prazer, um prazer num nível muito profundo e intenso, esse animal é o gato. Talvez o pensamento verbal, a vida civilizada e moderna, tenha nos tornado menos conscientes e apropriadores de certas experiências do que um simples gato. Quantas pessoas você conhece que param no meio da rua e se deixam tomar pelo simples prazer de um banho de sol -- ainda que isso seja possível? Nós estamos sempre ocupados demais correndo para obter dinheiro para comprar coisas que não precisamos e pensando em maneiras de nos tornar diferentes dos demais animais e iguais entre nós mesmos, e acabamos perdendo de vista os pontos nos quais somos todos iguais e ao mesmo tempo completamente diferentes. Isso por que somos únicos. E os animais também. Eu já tive muitos gatos e alguns cachorros. Nenhum era igual ao outro e, pelo menos no que diz respeito ao significado no senso comum da palavra 'personalidade', todos eles tinham personalidades bem próprias e bem definidas, individualmente.
Será que a falta de giros do cíngulo, frontal inferior, supramarginal e angular avantajados transforma os indivíduos em zumbis? Humm.. Eu acredito que não, se fosse o caso George Romero faria filmes sobre criaturas portadoras de afasias.
Ah, e só para terminar... Sim, me senti ofendido pela hipótese levantada e talvez eu a tenha interpretado mal. Mas, que coisa, está é a minha experiência subjetiva quanto ao que li. (:
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WILLIAM CALVIN
Neurobiólogo, University of Washington, autor de A Brief History of the Mind
Fonte: http://www.edge.org/q2005/q05_10.html#calvin
Dan Dennett está certo em seus comentários quando ele põe ênfase na aquisição da linguagem, não possuindo linguagem, como uma condição para o nosso tipo de consciência. Para todos os efeitos, eu tenho algumas (altamente improváveis) crenças sobre o motivo pelo qual a aquisição de uma linguagem estruturada na idade pré-escolar é tão importante para todas as demais funções intelectuais de alto nível. Além da sintaxe, o intelecto inclui coisas estruturadas como planejamento contingente de múltiplos-estágios, cadeias de lógica, jogos com regras arbitrárias, e a nossa paixão por descobrir "como as coisas funcionam."
Muitos animais possuem alguma versão de um período crítico para sintonizar a percepção sensorial. Os seres humanos também parecem ter um [período destes] para a linguagem estruturada, a julgar pela experiência com crianças surdas de pais ouvintes que não expostas a uma linguagem de sinais rica durante os anos da pré-escola. Oliver Sacks, em "Seeing Voices", descreveu o caso de um garoto de 11 anos de idade que era tido como retardado mas que na verdade era apenas surdo. Depois de um ano de instrução na ASL (linguagem de sinais americana), Sacks o entrevistou:
"Joseph viu, distinguiu, categorizou e usou; ele não teve problemas com categorização perceptiva ou generalização, mas ele não podia, ao que parece, ir muito além disso, como sustentar idéias abstratas em sua mente, refletir, jogar, planejar. Ele parecia completamente incapaz de utilizar imagens ou hipóteses ou possibilidades, incapaz de entrar em um reino imaginativo ou figurativo... Ele parecia, como um animal ou um bebê, estar preso ao presente, estar confinado à percepção literal e imediata..."
No primeiro ano, o bebê está ocupado criando categorias para os sons falados que escuta. No segundo ano, o bebê está ocupado adquirindo novas palavras, cada uma composta por uma série daqueles blocos edificadores dos fonemas. No terceiro ano, ele começa a adquirir aquelas combinações típicas de palavras, que nós chamamos de gramática ou sintaxe. Ele logo começa a se formar na fala de sentenças longas e estruturadas. No quarto ano de idade, ele consegue inferir um padrão às sentenças e começa a exigir finais apropriados às histórias que ouve. É como uma pirâmide, usando os blocos de construção sobre os níveis imediatamente subjacentes. Quatro níveis em quatro anos!
Estes anos são repletos de conexões por meio do ajustamento e melhoramento das conexões pré-natais entre os neurônios corticais, parcialmente com base em quão útil uma conexão tem sido até aquele momento na vida. Algumas destas conexões ajudam a montar uma nova combinação de palavras, verificam coisas que não fazem sentido por meio de algum controle de qualidade, e então - mirabile dictu - uma sentença inteiramente nova é proferida. Algumas deve estar em espaços de trabalho que poderiam planejar não apenas sentenças, mas uma agenda para o fim de semana ou uma cadeia lógica, ou checar uma jogada de xadrez antes de ser feita - até mesmo ser afetada por música estruturada com suas múltiplas melodias interligadas.
Então, sintonizar este espaço de trabalho para a linguagem estruturada nos anos da pré-escola iria acarretar estes outros aspectos estruturais do intelecto. É por isso que eu gosto de enfatizar na aquisição da linguagem como uma pré-condição para a consciência: afinar para a estrutura de sentenças pode fazer com que uma criança seja mais capaz de realizar tarefas não lingüísticas que também necessitam de alguma estruturação. Melhore uma, melhore todas?
É isso que impulsiona nossa sabedoria e inteligência? Seria "o nosso tipo de consciência" nada mais do que o intelecto estruturado com um bom controle de qualidade? Não sou capaz de provar isso, mas com certeza me parece um bom candidato.
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Sem dúvida que a linguagem estruturada é importantíssima para a experiência humana. Mas ainda não estou convencido de que seja um pré-requisito indispensável para a consciência de modo geral.
Muitos animais possuem alguma versão de um período crítico para sintonizar a percepção sensorial. Os seres humanos também parecem ter um [período destes] para a linguagem estruturada, a julgar pela experiência com crianças surdas de pais ouvintes que não expostas a uma linguagem de sinais rica durante os anos da pré-escola. Oliver Sacks, em "Seeing Voices", descreveu o caso de um garoto de 11 anos de idade que era tido como retardado mas que na verdade era apenas surdo. Depois de um ano de instrução na ASL (linguagem de sinais americana), Sacks o entrevistou:
"Joseph viu, distinguiu, categorizou e usou; ele não teve problemas com categorização perceptiva ou generalização, mas ele não podia, ao que parece, ir muito além disso, como sustentar idéias abstratas em sua mente, refletir, jogar, planejar. Ele parecia completamente incapaz de utilizar imagens ou hipóteses ou possibilidades, incapaz de entrar em um reino imaginativo ou figurativo... Ele parecia, como um animal ou um bebê, estar preso ao presente, estar confinado à percepção literal e imediata..."
No primeiro ano, o bebê está ocupado criando categorias para os sons falados que escuta. No segundo ano, o bebê está ocupado adquirindo novas palavras, cada uma composta por uma série daqueles blocos edificadores dos fonemas. No terceiro ano, ele começa a adquirir aquelas combinações típicas de palavras, que nós chamamos de gramática ou sintaxe. Ele logo começa a se formar na fala de sentenças longas e estruturadas. No quarto ano de idade, ele consegue inferir um padrão às sentenças e começa a exigir finais apropriados às histórias que ouve. É como uma pirâmide, usando os blocos de construção sobre os níveis imediatamente subjacentes. Quatro níveis em quatro anos!
Estes anos são repletos de conexões por meio do ajustamento e melhoramento das conexões pré-natais entre os neurônios corticais, parcialmente com base em quão útil uma conexão tem sido até aquele momento na vida. Algumas destas conexões ajudam a montar uma nova combinação de palavras, verificam coisas que não fazem sentido por meio de algum controle de qualidade, e então - mirabile dictu - uma sentença inteiramente nova é proferida. Algumas deve estar em espaços de trabalho que poderiam planejar não apenas sentenças, mas uma agenda para o fim de semana ou uma cadeia lógica, ou checar uma jogada de xadrez antes de ser feita - até mesmo ser afetada por música estruturada com suas múltiplas melodias interligadas.
Então, sintonizar este espaço de trabalho para a linguagem estruturada nos anos da pré-escola iria acarretar estes outros aspectos estruturais do intelecto. É por isso que eu gosto de enfatizar na aquisição da linguagem como uma pré-condição para a consciência: afinar para a estrutura de sentenças pode fazer com que uma criança seja mais capaz de realizar tarefas não lingüísticas que também necessitam de alguma estruturação. Melhore uma, melhore todas?
É isso que impulsiona nossa sabedoria e inteligência? Seria "o nosso tipo de consciência" nada mais do que o intelecto estruturado com um bom controle de qualidade? Não sou capaz de provar isso, mas com certeza me parece um bom candidato.
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Sem dúvida que a linguagem estruturada é importantíssima para a experiência humana. Mas ainda não estou convencido de que seja um pré-requisito indispensável para a consciência de modo geral.
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Um comentário:
Relendo e pensando: segundo a Filosofia da Mente, [ainda] não é possível provar a existência de outras mentes. Logo, dentro desta acepção, não posso provar para os outros a existência da minha mente. Se minha mente sou eu, e eu acredito em mim mesmo, logo acredito em algo que não posso provar.
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