quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Conhecimento e Consciência


Como a experiência consciente se relaciona com a memória da experiência consciente? Lembrar-se da experiência de algo é, por si, uma experiência consciente? E como a experiência consciente se relaciona com o conhecimento? Conhecer amplia nossa consciência?
Por exemplo, vamos imaginar que um entrevistador estivesse conversando com Mary, a Supercientista que nunca viu a cor vermelha. Para os fins deste exemplo, Mary e o entrevistador são organismos completamente preto e branco e ambos são capazes de enxergar a cor vermelha, porém Mary passou sua vida toda isolada em um quarto onde tudo era preto e branco. O entrevistador pergunta para Mary, que conhece absolutamente tudo sobre a fisiologia da visão e sobre as propriedades físicas das cores, como é experienciar a cor vermelha. Mary não sabe.
O entrevistador fica perplexo, pois para ele, a mera menção da cor trás a lembrança e com a lembrança a experiência.
Neste momento o entrevistador põe a mão no bolso e puxa um lenço... de uma determinada cor. Mary se vê diante de uma experiência completamente nova. Provavelmente, sabendo tudo sobre os aspectos físicos das cores, ela classificaria tal experiência como a visão de uma nova cor. Saberia ela de que cor era o lenço? Como ela poderia saber sem nunca ter experienciado as cores?
Mary então pergunta para o entrevistador, o que é que está havendo. O que ele têm para lhe dizer sobre aquele lenço. Ao que o entrevistador responde, com um pouco de embaraço, que aquele lenço que ele puxou por descuido de seu bolso estragando toda a experiência, é um lenço vermelho.
Mary pega o lenço com as mãos, toca, observa, e se regojiza por dentro, tendo finalmente alcançado a experiência crua e subjetiva de observar a cor vermelha.
O entrevistador pede para que Mary nada fale sobre o ocorrido, pois ele perderia o emprego. Mary concorda com ele, pensando na possibilidade de enganar os demais cientistas que estudaram seu caso enquanto ela permanecia presa no quarto por todos estes anos de sua vida.
Alguns meses se passaram e o experimento de Mary chega ao seu desfecho final. Um dos cientistas entra no quarto onde Mary está e lhe pergunta se ela sabe como é experienciar a cor vermelha. Mary responde que não com o ar mais frustrado que consegue representar, embora esteja lembrando-se do lenço do entrevistador e deleitando-se com sua travessura.
O cientista então pergunta se ela está preparada para conhecer a cor vermelha, ao que Mary responde que sim, fingindo uma certa insegurança desta vez. Ela é conduzida até uma sala na qual há um objeto retangular coberto por um pano branco. O pano é levantado, desvelando um quadro completamente vermelho diante de seus olhos...
Desta vez Mary não precisa fingir nada, pois está realmente atônita. A experiência lhe é completamente nova, pois nunca ela havia visto nada como aquilo que agora ela vê. O cientista, percebendo o franco assombro de Mary, pergunta o que há de errado. Mary tenta encontrar palavras, mas nada consegue dizer.
Então uma porta se abre e quem entra na sala é o entrevistador. Vestido como o cientista que acompanha Mary, ele se apresenta como sendo também um cientista.
O assombro de Mary começa a dar espaço para um sentimento de indignação que parecia prever o que viria asseguir.
O cientista puxa o lenço do bolso e com um sorriso diz: - Te apresento a cor verde.
Mary, que agora conhecia o vermelho e o verde, lembrava-se dos últimos meses nos quais passava horas a olhar fotos monocromáticas de rosas, imaginando suas pétalas em matizes de verde.
Eventualmente Mary consegue perdoar os cientistas maldosos, pois ela mesma era uma cientista e estava interessada nos desdobramentos do experimento do qual participava.
Alguns dos quais remetem às perguntas com as quais iniciei este post. Assim como o cientista que se passava por entrevistador, a menção da cor vermelha remetia Mary a uma dada experiência consciente que, embora fosse a realidade para Mary, não era propriamente a realidade. Mary acreditava deter consigo a experiência consciente da cor vermelha quando na verdade tudo o que ela tinha era a experiência da cor verde. Era consciente esta experiência? Se sim, seria mais consciente se ela houvesse sido corretamente informada sobre a cor que observava?
Será que o conhecimento nos torna mais conscientes sobre o mundo que nos cerca?

Um comentário:

Daniel F. Gontijo disse...

"Será que o conhecimento nos torna mais conscientes sobre o mundo que nos cerca?"

Sim, e uma experiência consciente mais rica torna-nos mais capazes de atuar adaptativamente no mundo.

Um abraço.