sexta-feira, 15 de dezembro de 2017

Memória e Consciência

Algumas notas para pensar sobre como a memória se relaciona com a consciência e a percepção:

"Por exemplo, em um paciente sob meus cuidados, uma trombose repentina na circulação posterior do cérebro causou a morte imediata das várias partes visuais do cérebro. Dali por diante, este paciente tornou-se totalmente cego, porém sem o saber. Ele parecia cego, mas não se queixava. Perguntas e exames mostraram, sem sombra de dúvida, que ele estava central ou 'corticalmente' cego, mas que também perdera todas as suas imagens ou memórias visuais, que as perdera totalmente, embora não tivesse idéia de perda alguma. De fato, ele perdera a própria ideia de visão e não só era incapaz de descrever algo visualmente, como, também, ficava confuso quando eu usava as palavras 'enxergar' e 'luz'. Em essência, ele se tornara um ser não visual. Todo seu tempo de vida como pessoa que exergava, seu tempo de visualidade, fora efetivamente roubado. De fato, toda sua vida visual fora apagada - e apagada permanentemente - no momento do ataque. Essa amnésia visual e (por assim dizer) cegueira para a cegueira, amnésia para amnésia, constitui efetivamente uma síndrome de Korsakov 'total' restrita à visualidade." SACKS, Oliver. O homem que confundiu sua mulher com um chapéu. São Paulo: Companhia das Letras, 2007. pg. 56-7

Levando em consideração os relatos de danos no Sistema Nervoso Central (SNC) e de danos no Sistema Nervoso Periférico (SNP), para danos no SNP que levam à perda parcial ou total de alguma função e para danos no SNC que levam à perda parcial de uma função, os pacientes tendem a perceber suas condições, exibindo consciência da perda. Porém para danos difusos no SNC que levam a perda completa de alguma função, os pacientes podem permanecer alheios a tal perda, como se, de alguma forma, jamais houvessem possuído tal função. No passado, atribuía-se isso ao mecanismo psicológico de negação; mas atualmente sabe-se que uma parte da consciência destes indivíduos foi eliminada. A inabilidade de tomar conhecimento sobre aspectos visuais da realidade relaciona-se também pode ser explorada na negligência hemispacial, mais comum em traumatismos que afetem o hemisfério direito do cérebro, levando à deficiência na percepção campo visual esquerdo. Tal paciente pode ignorar tudo que se encontra a esquerda do campo visual, fazendo a barba em apenas metade do rosto, comendo apenas metade do prato que é servido, etc.
Susanne Ferber e colaboradores demonstraram que pacientes que sofrem de heminegligência, enquanto visualizavam pares de faces quiméricas (uma composição onde metade da face sorri a outra metade da mesma face está neutra) tipicamente escolhiam a face cuja qual a metade direita aparecia sorrindo ao indicarem a face feliz. Mas, quando foi empregado um prisma para inverter o campo de visão para a esquerda, os pacientes apresentaram um aumento nos movimentos visuais voltados para as faces a esquerda, mas ignoraram o aspecto quimérico do estímulo.

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