Foi num dia chuvoso. Uma semana havia se passado sem que ele a visse.
Horas e horas, milhas e milhas rodadas com seu corpo inerte no banco daquele ônibus. Todos os dias ele fazia a mesma coisa: descia, dirigia-se até a frente do velho prédio, apoiava o corpo contra a parede e, sob a inadequada luz do poste abria um livro e começava a ler.
De tempos em tempos ele erguia o olhar sobre as letras e mirava a escuridão da rua. Não importava quanto tempo ele esperasse, ela não mais aparecia.
Todos os dias, após algumas horas lendo em pé e esperando, ele guardava o livro na mochila e dirigia-se para a porta do bar. Lá ele não entrava, apenas permanecia parado do lado de fora observado o movimento e imaginando se aquele recado que ele havia deixado no mural ainda estava lá.
O recado dizia mais ou menos assim: te amo, por isso te espero. Te espero amando cada minuto e sorvendo esse cálice de angústia como se fosse conhaque que nada mais faz do que aquecer meu peito. Um dia estaremos juntos, mesmo que já não me reconheças. Um dia, naquela mesma mesa em que sentamos, você irá olhar nos meus olhos e irá, se pronunciar uma única palavra, mostrar-me tudo aquilo que eu preciso saber.
Não estava assinado. Seu amor por ela era anônimo e óbvio, ridiculamente escondendo-se como pessoas escondem-se no silêncio das palavras apenas para revelar seus sentimentos em olhares.
Mas já havia uma semana que ele não mesclava seu campo de visão ao dela. O que fazer? Durante toda sua vida ele segurou frouxamente a mão da sanidade. Não lhe custaria nada largá-la agora.
Ele preferiu um método novo. Saiu dali para não mais voltar, decidiu fazer como um pintor que muda suas tintas e com rápidas pinceladas recobre sua arte mudando as tonalidades de seus sentimentos. “Não mais irei amá-la” - pensou ele. Acreditando nesta prerrogativa, foi ao encontro de uma nova vida onde mais tarde nem ele mesmo se reconheceria. Amou intensamente, mas sempre sonhou com ela ao fechar os olhos. Acordava já vestido com a máscara que decidira usar e sem perceber essa mesma máscara iria deformando suas verdadeiras feições, transformando-o no cruel e triste personagem que ele havia criado. Suas mentiras iam caindo uma a uma, seu castelo de areia transformaria em lágrimas, tantas lágrimas que pensaria em morrer. E na verdade, parte do que ele era morreu, mas não matou seu amor por ela.
Todas as noites ele entrava num mundo onde o tempo havia parado e lá ele ainda era aquele jovem sonhador descobrindo novidades em livros que foram escritos muito antes dele nascer. Naquele mundo ele ainda tinha o frescor na pele e o brilho no olhar, que só uma paixão juvenil é capaz de trazer, e sentia todo seu corpo como se fosse coberto por zonas de sensíveis ao prazer do toque dela.
Acordar só não era insuportável pois a lembrança de seus sonhos logo se esvanecia ante a visão da vida que construiu.
Enlouquecido após tanto tempo flertando com a falsidade, procurou uma saída. Ergueu-se violentamente, sem notar que a maior violência aflingiria a si mesmo conforme suas ações. Mas nenhuma violência seria maior do que continuar ali como estava.
Para alcançar a liberdade foi capaz de rasgar sua obra, uma tela que lhe custara tão caro que tivera de pagar com a essência de sua juventude. E ele não deixou transparecer nenhuma dor enquanto desconstruía a si mesmo publicamente, embora estivesse em terrível agonia por dentro.
Horas e horas, milhas e milhas rodadas com seu corpo inerte no banco daquele ônibus. Todos os dias ele fazia a mesma coisa: descia, dirigia-se até a frente do velho prédio, apoiava o corpo contra a parede e, sob a inadequada luz do poste abria um livro e começava a ler.
De tempos em tempos ele erguia o olhar sobre as letras e mirava a escuridão da rua. Não importava quanto tempo ele esperasse, ela não mais aparecia.
Todos os dias, após algumas horas lendo em pé e esperando, ele guardava o livro na mochila e dirigia-se para a porta do bar. Lá ele não entrava, apenas permanecia parado do lado de fora observado o movimento e imaginando se aquele recado que ele havia deixado no mural ainda estava lá.
O recado dizia mais ou menos assim: te amo, por isso te espero. Te espero amando cada minuto e sorvendo esse cálice de angústia como se fosse conhaque que nada mais faz do que aquecer meu peito. Um dia estaremos juntos, mesmo que já não me reconheças. Um dia, naquela mesma mesa em que sentamos, você irá olhar nos meus olhos e irá, se pronunciar uma única palavra, mostrar-me tudo aquilo que eu preciso saber.
Não estava assinado. Seu amor por ela era anônimo e óbvio, ridiculamente escondendo-se como pessoas escondem-se no silêncio das palavras apenas para revelar seus sentimentos em olhares.
Mas já havia uma semana que ele não mesclava seu campo de visão ao dela. O que fazer? Durante toda sua vida ele segurou frouxamente a mão da sanidade. Não lhe custaria nada largá-la agora.
Ele preferiu um método novo. Saiu dali para não mais voltar, decidiu fazer como um pintor que muda suas tintas e com rápidas pinceladas recobre sua arte mudando as tonalidades de seus sentimentos. “Não mais irei amá-la” - pensou ele. Acreditando nesta prerrogativa, foi ao encontro de uma nova vida onde mais tarde nem ele mesmo se reconheceria. Amou intensamente, mas sempre sonhou com ela ao fechar os olhos. Acordava já vestido com a máscara que decidira usar e sem perceber essa mesma máscara iria deformando suas verdadeiras feições, transformando-o no cruel e triste personagem que ele havia criado. Suas mentiras iam caindo uma a uma, seu castelo de areia transformaria em lágrimas, tantas lágrimas que pensaria em morrer. E na verdade, parte do que ele era morreu, mas não matou seu amor por ela.
Todas as noites ele entrava num mundo onde o tempo havia parado e lá ele ainda era aquele jovem sonhador descobrindo novidades em livros que foram escritos muito antes dele nascer. Naquele mundo ele ainda tinha o frescor na pele e o brilho no olhar, que só uma paixão juvenil é capaz de trazer, e sentia todo seu corpo como se fosse coberto por zonas de sensíveis ao prazer do toque dela.
Acordar só não era insuportável pois a lembrança de seus sonhos logo se esvanecia ante a visão da vida que construiu.
Enlouquecido após tanto tempo flertando com a falsidade, procurou uma saída. Ergueu-se violentamente, sem notar que a maior violência aflingiria a si mesmo conforme suas ações. Mas nenhuma violência seria maior do que continuar ali como estava.
Para alcançar a liberdade foi capaz de rasgar sua obra, uma tela que lhe custara tão caro que tivera de pagar com a essência de sua juventude. E ele não deixou transparecer nenhuma dor enquanto desconstruía a si mesmo publicamente, embora estivesse em terrível agonia por dentro.
Escrito por mim.
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