segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Localize-se

Encontrei os quadros abaixo numa velha enciclopédia na casa dos meus pais. São muito interessantes para localizarmos nossas idéias conforme a tradição filosófica com a qual mais nos identificamos.
Todo ser humano possui uma visão filosófica quanto ao mundo e quanto à vida, muitos já foram aqueles que escreveram sobre as mais diversas idéias - ou seja, independente de qual é a sua visão, alguém já deve ter escrito algo em alguma linha de pensamento semelhante. Desta forma, é uma boa idéia ler o que estas pessoas escreveram e quais são as críticas aos seus pensamentos, como forma de refinar o nosso próprio pensamento.


A ilustração abaixo é especialmente interessante para que identifiquemos o modo como estamos abordando um problema ou, ainda, os problemas em sua totalidade. No que acreditamos?


Materialistas: acreditam que a matéria é a única entidade - ou substância - que existe no Universo.
Idealistas: acreditam que a matéria é uma ilusão - “a alma imaterial é tudo o que existe”.
Monistas: crêem que só existe uma matéria - ou substância - fundamental.
Dualistas: acreditam em duas matérias - ou substâncias - fundamentais: o espírito e a matéria, a “mente” e o corpo, etc.
Deterministas: acreditam que os eventos são causados por outros eventos e que há leis para prevê-los.
Voluntaristas: acreditam no livre-arbítrio e em eventos sem causa, com base na natureza “divina” das vontades e liberdades humanas.
Empiristas: submetem as proposições à experiência.
Positivistas: levam o empirismo a um novo nível: tudo o que não faz parte da lógica, da matemática ou de uma ciência empírica é tido como desprovido de sentido.
Racionalistas: o ser humano nasce dotado de idéias inatas, anteriores à experiência e necessariamente verdadeiras.
Pragmatistas: afirmam que o conhecimento provém da ação prática, é adquirido por meio da experiência.
Céticos: negam o conhecimento porque os sentidos e a razão são enganosos.
Teleologistas: acreditam que uma ação é boa em razão de suas conseqüências.
Deontologistas: acreditam que uma ação é boa ou má independentemente de suas conseqüências.
Utilitaristas: medem o valor de um ato por sua utilidade (aspecto importante: para quem?).
Hedonistas: pensam que o único bem é a experiência do prazer ou da ausência de sofrimento.
Estóicos: a razão, e não os desejos e o prazer, devem guiar nossas ações.
Existencialistas: acreditam que a existência do ser humano precede sua natureza essencial, que não lhe é dada mas feita através de suas escolhas.

Quadros ilustrativos da enciclopédia Mundo do Saber.
Pensando sobre o quadro acima: a lógica é o instrumento que deve ser guiado pela ética e empregado na epistemologia, a epistemologia deve ser julgada pela estética - é curiosamente não pela ética, pense nisso... - e a metafísica deve ser não - muito (?) - mais do que aquilo que a epistemologia trazer...

Como já falei em outro post, minha visão quanto a natureza do Universo é bastante monista, materialista e determinística. Acredito que para toda ação há uma reação e que para cada reação há uma ação (ou um conjunto ou sistema) que a precede. Acredito que a matéria - moléculas, átomos, partículas, etc - e as leis que regem a matéria são tudo o que existem. Mas mantenho a mente aberta para novas hipóteses desde que estas obedeçam a lógica e tenham alguma fundamentação científica. O que me leva a outras questões...
Entre o racionalismo e o empirismo, especialmente no tocante ao positivismo, acredito que tudo aquilo que se pode pensar ou racionalizar, incluindo todas as crenças humanas, faz parte do real, ou daquilo que chamamos de realidade. Tudo aquilo que pensamos, tudo aquilo que imaginamos, possui uma base em alguma experiência que tivemos. É a minha resposta para a questão de se questionamos por causa daquilo que desconhecemos ou se questionamos por causa daquilo que conhecemos.
A imaginação, mesmo os devaneios, precisam se alimentados pois eu não acredito que tenhamos nascido com imagens mentais inatas - com exceção daquelas experiências que temos durante o desenvolvimento intra-uterino e até que ponto tais experiências alimentam os sentidos e perduram ou exercem impacto sobre a formação dos esquemas que já está determinada filogeneticamente.
Desta forma, mesmo as crenças mais absurdas, como fantasmas, extraterrestres e criaturas fantásticas, possuem alguma contraparte na realidade, ainda que esta contraparte seja muito diferente daquela que se imagina como resultado de uma apreensão incompleta e imperfeita dos fenômenos vivenciados.
Por exemplo, tanto a vida após a morte, quanto vidas passadas ou reincarnação, podem ser simplesmente crenças derivadas do fato de que os seres humanos falam sobre, pensam sobre e deixam influenciar-se pelas pessoas que já viveram e não vivem mais. Inicialmente na memória e nas palavras daqueles que conheceram os falecidos e, com o advento da linguagem escrita e uma maior extensão de registro histórico, aumentando a memória global humana de modo a incluir pessoas que se destacam historicamente, damos vida a pessoas que já morreram a muito tempo e até mesmo pessoas com quem jamais travamos contato pessoal. Uma interpretação errada sobre esse fenômeno puramente mnemônico e histórico, pode ser o fundamento da crença na continuidade da vida, que de fato existe na forma da memória e dos registros, uma vez que estes exercem influência sobre a realidade, mas não na forma de um espírito vagando de corpo em corpo ou sem corpo ou como quer que seja.
Assim sendo, uma postura cética é útil na construção do saber, uma vez que nossos sentidos são incompletos - não são capazes de apreender a realidade em sua totalidade (não somos capazes de ver todo o espectro possível de cores, nem de ouvir todo a gama possível de sons, nem podemos nos orientar por meio do magnetismo terrestre, etc) - e os meios artificiais que criamos e usamos para explorar a realidade estão em constante aprimoramento. Também é verdade que um maior conhecimento trás maiores e melhores questões. A boa descoberta é aquela que, mais do que responder a uma dúvida, trás consigo muitos novos questionamentos levando a uma busca pela ampliação posterior acerca de um aspecto da realidade.
Ainda quanto ao racionalismo, mesmo neste existe alguma verdade, uma vez que a configuração geneticamente determinada de nossos corpos, em especial do sistema nervoso, nos programa a reagir de certas formas - algumas que só irão se expressar com alguma maturação - inatas, ou instintivas, que são úteis para a nossa sobrevivência e que são finamente “sintonizadas” a medida que são expostas às experiências.
O bebê nasce programado para buscar o peito da mãe e mamar, realizando o movimento de sucção sem a necessidade de que alguém lhe ensine. A medida que as experiências de fome e de saciedade se repetem, seu comportamento vai ganhando uma maior complexidade, ao “negociar” a disposição da mãe por meio do choro, etc. Esse comportamento é necessariamente verdadeiro, uma vez que a nutrição e o cuidado carinhoso são indispensáveis para a vida.
Assim, sou inclinado a defender uma certa compatibilidade entre um racionalismo fundamentado na genética, ou naqueles comportamentos instintivos, e um pragmatismo que refina tais comportamentos e lhes permitem uma complexidade cada vez maior por meio da exposição às experiências advindas do ambiente.
Analisando os aspectos éticos do que já foi visto a respeito da exploração da realidade e do conhecimento de “verdades” - de que nosso conhecimento acerca da realidade é limitado e imperfeito, em constante construção como indivíduo e enquanto integrantes da espécie humana, e que possuímos “verdades” inatas apenas no sentido filogenético - acredito que do ponto de vista do observador de segunda mão, uma ação é boa ou má em razão de suas conseqüências, enquanto que, do ponto de vista daquele que executa a ação, esta será boa ou má em razão de seus objetivos. Penso que uma pessoa será capaz de agir tão bem quanto lhe for dado a entender a realidade e prever a extensão das conseqüências de suas ações. Ações bem fadadas possuem uma maior probabilidade de virem a ser repetidas, enquanto as mal fadadas possuem uma tendência a serem extintas - daí a importância de se ter a chance de errar e prosseguir e de ser instrumentalizado intelectualmente para poder escrutinar as experiências vividas.
Acredito que a ética deva ser assumida de uma forma relativística, tendo como regra apenas a vontade de se fazer o melhor com aquela compreensão que se tem da realidade. O ser humano aprende nos moldes do behaviorismo, pelo comportamento operante, mas intrínseco a este processo de aprendizagem está a tendência a auto-atualização, a busca daquilo que é melhor para si, de um crescimento para si, individualmente e no contexto social. O mal, desta forma, é fruto da ignorância e só existe para os observadores de segunda mão, aqueles que não participam diretamente da realização das ações.
Quanto a utilidade decorrente das ações humanas, o prazer defendido pelos hedonistas é importante para reforçar as ações que são bem fadadas, que são boas, mas sem dúvida que na complexidade da vida de uma criatura dotada de um neocórtex tão complexo quanto o do ser humano, algumas conseqüências de extrema utilidade e que irão prover grande prazer, exigem um labor intenso e de uma certa duração - muitas vezes envolvendo algum sofrimento ou ausência de prazer - para que possam se realizar. É o caso do crescimento intelectual, por exemplo, que para ser completo exige o estudo de assuntos que nem sempre despertam o nosso interesse mas que serão de vital importância para que possamos abordar assuntos do nosso maior interesse de uma forma mais elaborada. Nós devemos buscar o prazer, pois o desprazer, assim como a dor, é sinal de que estamos fazendo algo de errado e potencialmente prejudicial para nós mesmos, mas também devemos usar nossa capacidade de análise e planejamento e estar dispostos a suportar algum sofrimento e desprazer para poder alcançar objetivos maiores.

Nem sempre concordamos com eles, ou com tudo o que eles nos trazem, mas não podemos deixar de agradecer a eles - estas figuras icônicas acima e muitos outros, também - por nos apresentarem as perguntas e por nos indicarem as respostas.

Assim, neste momento da minha vida, me posiciono como determinista, por acreditar em cadeias de eventos que determinam os resultados alcançados; monista e materialista, pois acredito que exista apenas uma substância fundamental no Universo e que esta substância deve ser explicada pelas investigações nos campos da física e da química; empirista e positivista, por acreditar que as crenças devem ser escrutinadas pelo método científico; acredito num racionalismo genético, no sentido de que a evolução nos dá uma programação básica para que possamos interagir de maneira eficiente com a realidade natural; cético por acreditar que nossos meios de investigação serão sempre incompletos e sempre passíveis de melhorias - vendo assim um compatibilismo entre o empirismo positivo, racionalismo (no sentido de uma verdade evolucionária!!) e ceticismo; acredito numa relatividade ética, onde o sujeito está para a deontologia e os observadores estão para a teleologia, e que o julgamento das conseqüências deve levar em consideração a capacidade atual - em relação a ação - do sujeito, a natureza auto-atualizadora que todo organismo vivo possui - afinal o objetivo é sobreviver e se reproduzir, e o comportamento operante como método de aprendizagem, no qual as conseqüências como forem apreendidas pelo organismo irão determinar - ainda que de forma probabilística - seu futuro comportamento; acredito que dada esta natureza da qual fazemos parte, e por causa de nossa singularidade em relação à razão (afinal, nós pensamos - porque existimos, mas pensamos), seja necessário ter em mente um equilíbrio entre o hedonismo e o estoicismo, uma vez que a conduta sempre terá motivações hedonísticas, inclusive narcísicas, mas deva ser intermediada pela racionalidade para que seja mais proveitosa.
Que grande salada, huh? Algumas pessoas pensam que é abuso misturar de tal forma tantas linhas de pensamento e até mesmo a terminologia. Já eu, acredito que é auto-abusivo se restringir a apenas uma linha de pensamento. (:

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